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Sistema de aterramento de uma usina solar fotovoltaica

As plantas de geração fotovoltaica abrangem uma grande variedade de instalações. No âmbito da CE 003:102.001 – Aterramentos Elétricos, do CB-3 – Comitê de Eletricidade da ABNT, existe a tendência de se adotar a seguinte classificação: geradores fotovoltaicos e usinas fotovoltaicas.

Sendo geradores fotovoltaicos as plantas que atendem diretamente um consumidor, instaladas em coberturas de edificações ou de estacionamentos (residenciais, comerciais e industriais), ou no solo, em terrenos anexos a outras instalações.

E as usinas fotovoltaicas as plantas de geração dedicadas, de solo, compreendendo vários arranjos fotovoltaicos e interconectadas diretamente à rede de média-tensão de uma concessionária ou interligadas ao SIN (Sistema Interligado Nacional) por meio de uma subestação de alta-tensão, instaladas também em consórcio com outras plantas geradoras, seja junto a um parque eólico ou em uma represa de uma hidroelétrica (usinas fotovoltaicas flutuantes).

Usinas Fotovoltaicas

Estas plantas têm área significativa, usualmente acima de 1 ha, e são subdivididas em unidades menores, por vezes chamadas de setores, cada uma constituída por arranjos de placas fotovoltaicas interligadas a uma unidade conversora, onde inversores fazem a conversão c.c./c.a.

Nestas usinas é comum o uso de trackers, estruturas de suporte dos módulos fotovoltaicos motorizadas, comandadas por equipamentos que monitoram a posição do Sol e rotacionam as mesas dos arranjos fotovoltaicos de modo a maximizar a geração de energia ao longo do dia.

Nas plantas de médio porte, com potência típica na faixa de 1 MWp a 5 MWp, a energia c.a. produzida por grupos de setores é elevada para uma tensão de distribuição (13,8 kV ou 25 kV) para a interligação com a rede da concessionária de energia local.

Nas usinas de grande porte os setores são maiores, da ordem de 10 MWp, e concentram a energia c.c. nas unidades de conversão (conversion unities), onde estão localizados os inversores e onde é feita a elevação da tensão, normalmente para 34,5 kV, sendo a energia gerada enviada por meio de circuitos subterrâneos para a subestação coletora. 

O sistema de aterramento de uma usina fotovoltaica é formado por uma malha de aterramento, usualmente de cabo de cobre nu ou de aço-cobreado de 50 mm², que não tem o padrão reticulado da malha de uma subestação, e utiliza ao máximo as valas de cabos existentes. Um anel de aterramento no perímetro da usina fotovoltaica é mandatório. O projeto deste sistema de aterramento tem três objetivos básicos:

  • fornecer um caminho para a terra para correntes elétricas em geral, que podem ser cargas eletrostáticas, descargas atmosféricas ou faltas para a terra na rede de energia c.c./c.a.;
  • garantir o controle dos potenciais de passo e de toque em toda a área da usina fotovoltaica, quando da ocorrência de uma falta para a terra na subestação coletora;
  • promover a equipotencialização de todas as estruturas de trackers e de equipamentos (caixas de ligação, inversores, transformadores etc.) – onde o termo equipotencialização significa interligação, até porque é impossível a efetiva equipotencialização de um sistema de aterramento deste porte, mesmo em 60 Hz.

Normas de aterramento de usinas fotovoltaicas

Frequentemente recebemos projetos de sistemas de aterramento de plantas solares que tratam a usina fotovoltaica como se fosse uma grande subestação, por vezes com uma malha de aterramento que constitui um imenso reticulado.

Trata-se de um equívoco comum, devido ao fato deste tipo de planta de geração ser relativamente recente no Brasil e, também, por ainda não haver uma norma ABNT que aborde o sistema de aterramento de usina fotovoltaica de grande porte.

No âmbito da normalização internacional existe a norma IEC/TS 62738:2018 – Ground-mounted photovoltaic power plants – Design guidelines and recommendations, que aborda usina fotovoltaica de solo de grande porte, porém é omissa quanto ao sistema de aterramento.

A norma norte-americana IEEE-2778-D4 – IEEE Guide for Solar Power Plant Grounding for Personnel Protection, aborda bem o tema, focando usina fotovoltaica de solo com mais de 5 MWp de potência instalada.

Esta norma enfatiza bastante as diferenças entre os projetos de aterramento de uma usina fotovoltaica e de subestações, estas últimas regidas pela conhecida norma IEEE Std. 80.

Atualmente o comitê de CE 003:102.001 – Aterramentos Elétricos, do CB-3 – Comitê de Eletricidade da ABNT, está trabalhando na elaboração de uma norma brasileira de aterramento de usina fotovoltaica de grande porte. 

A norma IEEE-2778-D4:2020

O escopo da norma IEEE foca usina fotovoltaica de solo com mais de 5 MWp de potência instalada e enfatiza bastante as diferenças entre os projetos de aterramento de usina fotovoltaica e de subestações, estas últimas regidas pela conhecida norma IEEE Std. 80.

Neste aspecto, o guia observa a não aplicabilidade às subestações das usina fotovoltaica, porém se os sistemas de aterramento da SE e da usina fotovoltaica estiverem interligados, partes do guia podem ser aplicáveis.

Da mesma forma, o escopo destaca a sua não-aplicabilidade a geradores fotovoltaicos, aterramentos de subestações e aos sistemas de proteção contra raios.

O guia destaca que o seu objeto principal é a proteção de pessoas com relação a faltas para à terra na rede elétrica da usina fotovoltaica. A falta para à terra mais crítica, do ponto de vista de segurança humana, é a que pode ocorrer no barramento de média ou alta-tensão da subestação da usina fotovoltaica. Neste aspecto é enfatizada a necessidade do controle dos potenciais de passo e de toque em toda a área da usina fotovoltaica. 

As medições de resistividade do solo devem ter em mente a modelagem de camadas rasas e profundas do solo. As sondagens para a modelagem das camadas rasas devem ser feitas ao longo de uma matriz de estações espaçadas da ordem de 500 m, com espaçamentos Wenner de até 32 metros.

A modelagem das camadas profundas exige uma quantidade menor de pontos de sondagem, porém com aberturas de eletrodos de corrente da ordem de até 1 km.

A norma reconhece que o sistema de aterramento de uma usina fotovoltaica é formado pelas estruturas metálicas acima do solo interligadas por cabos de cobre nu ou de aço-cobreado enterrados.

É enfatizado que um bom projeto vai utilizar o mínimo de cabo necessário para promover a interligação das estruturas dos trackers entre si e às Conversion Unities, que são conjuntos de inversores e transformadores elevadores que atendem um determinado setor de arranjos fotovoltaicos. As Conversion Unities devem ser providas de um anel de aterramento.

Devido à grande área de uma usina fotovoltaica, a norma observa a inadequação de uma malha de padrão reticulado, conforme é feito nos projetos de subestações, assim como o uso de brita para aumentar os valores de tensões de passo e de toque toleráveis.

Devido à grande quantidade de material utilizado no sistema de aterramento de uma usina fotovoltaica, não são viáveis economicamente dimensionamentos conservativos ou o superdimensionamento, conforme tipicamente se observa em subestações.

Em termos de topologia básica do sistema de aterramento a norma sugere anéis no perímetro de setores de arranjos fotovoltaicos, entre 1 MWp e 4 MWp, o que resulta em uma malha com reticulado da ordem de 150 m, conforme mostra a Figura 1.

As estruturas dos trackers podem fazer parte deste sistema de aterramento, eliminando a necessidade do reticulado, conforme ilustrado na Figura 2. Ainda assim, o anel perimetral pode ser necessário, para o controle dos gradientes de potenciais no solo.

A norma observa que a grande área do sistema de aterramento de uma usina fotovoltaica torna inviável o cálculo manual dos aterramentos, e esclarece que são necessários recursos de software de simulação bem mais rigorosos do que os utilizados para o projeto de aterramentos de malhas de aterramento de subestações.

Neste caso, faz-se necessária a utilização de um software que tenha capacidade de modelagem de sistemas de grande porte e que considere a impedância longitudinal dos condutores (malha não equipotencial).

A cerca deve ser objeto de preocupação, com o cálculo dos potenciais de toque e a avaliação da sua interligação, ou não, ao sistema de aterramento da usina fotovoltaica.

Finalmente a norma aborda a questão do comissionamento, recomendando avaliações de integridade do sistema de aterramento e informando que um projeto baseado em um modelo de solo adequado compensa a impossibilidade da medição de resistência/impedância de aterramento, em função do porte do sistema.

Figura 1: Malha de aterramento conceitual de uma UFV com reticulado da ordem de 150 m [reprodução da Figura 2 da IEEE-2778-D4:2020].

  • Figura 1: Malha de aterramento conceitual de uma UFV com reticulado da ordem de 150 m [reprodução da Figura 2 da IEEE-2778-D4:2020]

Figura 2: Sistema de aterramento de uma UFV utilizando as estruturas dos trackers [reprodução da Figura 2 da IEEE-2778-D4:2020]

Figura 2: Sistema de aterramento de uma UFV utilizando as estruturas dos trackers [reprodução da Figura 2 da IEEE-2778-D4:2020]

Projeto de norma ABNT de aterramento de usina fotovoltaica

São listados abaixo os aspectos a serem considerados nesta norma, muitos dos quais são abordados na norma IEEE-2778-D4:2020:

  • aspectos relativos às campanhas geoelétricas e à modelagem do solo para o projeto do sistema de aterramento, complementando ou modificando os critérios básicos já estabelecidos na norma NBR-7117;
  • a corrente crítica para a UFV é a de falta para a terra no barramento de média ou alta-tensão da SE coletora – única corrente que vai fluir para o solo e que vai gerar gradientes de potenciais no solo (tensões de passo e de toque);
  • importância de software de simulação que considere a impedância longitudinal dos condutores – devido às grandes dimensões, o sistema de aterramento não é equipotencial;
  • interfaces do aterramento das UFV com os aterramentos dos seus subsistemas (c.a., c.c, média-tensão, alta-tensão), regidos por outras normas ABNT;
  • aterramento da rede de média-tensão, inclusive das blindagens dos cabos;
  • desempenho do sistema de aterramento frente a eventos de baixa-frequência, tipicamente uma falta para a terra na rede de média ou alta-tensão, e de natureza impulsiva, associados especialmente a quedas de raios;
  • aterramento da cerca – se a resistividade do solo é elevada (> 1000 Ωm) os gradientes de potenciais no solo mais críticos podem ocorrer nas quinas das cercas;
  • o comissionamento dos aterramentos da UFV deve focar nos testes de continuidade e de integridade das conexões, complementando ou modificando os critérios básicos já estabelecidos na norma NBR-15.749.

Fonte: https://canalsolar.com.br/sistema-de-aterramento-de-uma-usina-solar-fotovoltaica/